Saturday, November 17, 2007


memória
em mim
da máscara com que falas

um sussurro
escondido
terno que não és tu

escondidos
os teus pertences
não ocultos do meu olhar

vejo-te
assim
tão frágil como és...

falso

fala mentindo
como só ele sabe mentir
e se esconde ferido
por a face cair

toque de Midas


toca-me
tenho a minha boca esperando
toca-me
abro o meu sexo
à tua boca, às tuas mãos
toca-me
com esse toque feito ouro
que me tinge em luz e cor
toca-me
no corpo, na alma
droga-me
por favor!!!

Friday, September 28, 2007

d.o.r. & p.a.i.n.

I speak about pain ainda há três dias meu coração era dilacerado por uma onda de tiros de caçadeira perseguindo-me. os meus neurónios, depois da depressão que tivera, explodem-me em dor. pain... pain... pain... ah! os meus tímpanos são perfurados por sons que me martelam a dor de cabeça. os calmantes não mais funcionam e não consigo chegar ao sono profundo. de manhã bebo cinco cafés para me manter acordado, mas vejo que nada disso resulta.
a minha nuca incha com um tumor e parece-me ver além do real, muito mais fundo que as sombras e as formas e isso deixa-me um mal-estar.
pain
pain
pain
oh! i am tired of speaking about pain
shadows
shapes

ofusco
sufoco...

Wednesday, September 26, 2007

eterno penar

pedi-te que voltasses
perguntar-te-ia se me amas
e porquê?
sem saber a resposta
insistia em que me deixasses
por não nadares mais no meu mar.

sempre amei a forma como me olhavas
e como o teu corpo
queimava esta minha carcaça.
sempre supliquei que não saísses de casa
que não sumisses
que fosses sempre o meu silêncio antidepressico.

agora o tempo fecha-se
e eu perdi a noção das horas
mascarei meus olhos de luto.
- não sei se te amo
ou o meu corpo roi de auto-prazer
satisfatoriamente sem ti...

ouço-me perguntar por ti durante a noite
ouço-me a ver teus olhos em toda a parte
ouço-me a recusar estar contigo.

vejo...
não vejo...
tenho as pupilas a inflamar
vislumbro-me desconfortado
o ser ilha sem Deus.

recuso-me...
revolto-me...
deliro-me...
a impaciência...
descubro-me em múltiplas personalidades
as quais não domino
e que vejo espelhadas em toda a parte
alcanço-te no fim do monte
grande como o sol
assim que o atinjo logo rebolo
e o tormento volta eternamente.

pessoa


poderia ser-se mais pessoa,
seguir mais a norma,
não fosse eu mais que um rebelde
um adolescente ainda por crescer

claridade ofuscante (23 de Setembro de 2006)

mortalidade do nosso destino
são as coisas que mais tememos...

o medo da verdade
coisa que queima completamente
a alma sofre
a cor cinza da claridade
inspirada do olor do incenso
que nos devolve a paz à alma.

o nosso pétreo rosto na vista do ceifeiro
e o Caronte que nos apazigua
tudo nos ilude o coração
fazendo com um guarda-chuva barco
e, de olhos cansados,
nos leva nessa viagem
como droga mastigando a nossa sonolência
invade-nos um grande bem-estar.

três vezes estive eu à beira do lago
e mais outras tantas o avistei
mas sempre que o ceifeiro me levou de volta
aos campos de cinza
às cidades eternas
me drogaram de novo com vida.

Saturday, September 22, 2007

ASAE

certamente que toda a gente já ouviu falar deste organismo de inspecções português que tem andado a fazer das suas por todo o país. como empresa fiscalizadora devo dizer que agem com grande rigor, no entanto este tipo de fiscalização é completamente contraprodutivo a vários níveis.
em primeiro lugar o facto de serem um organismo que investiga vários tipo de actividades, desde a restauração, hotelaria, venda de produtos alimentares, movimentações na internet (lembrem-se do caso do BTuga, entre outras. sendo feito por um organismo único isto pode criar uma certa dispersão assim como o facto de não apresentarem pessoas suficientes para uma inspecção a todos os níveis de forma mais ou menos constante, ou seja, todas as situações que criaram continuaram a existir.
um outro ponto que considero fundamental é o facto de apreenderem produtos (em especial alimentos) que me pergunto para onde irão. deste modo pode, em alguns casos, pode gerar-se situações de perda de capital para o país, situação que considero lamentável.
um terceiro ponto que considero o mais condenável de todos é o facto de as inspecções não serem EDUCATIVAS. em várias inspecções feitas por este organismo houve queixas de os inspectores não dizerem às pessoas como devem fazer. no caso que considero mais próximo, devo referir que houve uma inspecção que durou um único dia aos locais de comércio de Fátima. das duas uma, ou estiveram em todos os locais um muito curto tempo, ou estiveram em poucos espaços. do que soube, estiveram em grande número de casas, o que mostra que, mesmo não tendo visto todas, as que viram só tiveram em preocupação encontrar os defeitos e não discutir com as pessoas o que deveriam fazer. além disso este tipo de inspecções tem um problema de injustiça para com as várias casas inspeccionadas: as primeiras são sempre as vistas com mais detalhe.
deste modo peço a quem vir, por acaso este artigo que veja que as inspecções a meu ver são absolutamente necessárias mas que percebam que sou totalmente contra a forma de acção das pessoas da ASAE que mostram não serem profissionais correctos para com várias formas de geração de lucro em Portugal

Thursday, August 23, 2007


alicia-me um café
convida-me a entrar
saudando-me com simpatia
a música agreable
e o olor de se ser lusitano.

em conversas que adoraria durarem horas
apresso-me a uma inesperada partida
que fica sempre na boca
o gosto de voltar

a tripla aliança
de um beirão,
um tenor
e mil risos
esgotam as minhas esperanças de querer partir.

faz-se tudo em espelhos
envolvidos em pesadas cortinas
com aroma a torrões tostados
que numa chávena depositados
com agrado
com carinho
fazem sempre esse no nosso café lusitano
marco fundo neste meu coração insano.

beijo a crista da minha alma
vermelha do asti ou vermute
longas quimeras como que droga inebriante nos meus olhos
Rosé!!!
não sei ser mais que um porto seco
vinagrado em lilazes corolas de beirão
coquettes de encharpes e William Lwasons'
tudo olha impávido esta luz de meia-noite
feita breu ao sabor das velas escorrendo visceralmente cera
alcoólico
ah esses copos de champagne!!!
a alegria bacante das trufas de chocolate
com um pouco de vocka por favor
assimilado astro
brandimel adocicado
nas escadas
nos sofás
bebem como se quisessem embebedar
e eu feito Morfeu velo-lhes os sonhos.

um cropier distribui cartas
mais um pouco de vermute
um cocktail para a mesa cinco
a minha margarita feita num oito com a tua tequilla
gemem borbulhas
e eu amo tudo isso
amo o distribuir dos copos
adoro os que são levantados da mesa
e logo são substituídos
amo tudo isto e muito mais
e sinto-o tão distante... tão distante de mim.

Ocaso (21 de Setembro de 2006)

procuro um olhar nesta funesta cidade
oitenta cêntimos, um punhado de papéis
tons de magenta e cinza
perpetuam a minha febre de ver gente.

rostos incomodados ao sabor de um cigarro
um cão danado deitado no chão
café posto na mesa
olha...
o sol já se vai pondo
é uma cidade de rotinas
de horas passadas no compasso do relógio
é tarde...
ai, amor
este era o tempo
que te esperava na esplanada de outono

é lindo o pôr do sol
como a morte a chegar-nos
sim, amor
é a estrela da cidade.

zumbem moscas nos esgotos
há transito
monstros da nossa sociedade
e eu e tu
fazemos a nossa história neste ocaso
feito de cinza e magenta
que se derrama em felicidade
na nossa triste fatalidade.

Balada do Candeeiro via Mosquito (13 de Setembro de 2006)


zzzzzzzzzzt!!!!
mais um mosquito nas grelhas eléctricas ferventes
neste pôr do sol vermelho a sangrar nuvens de leite.
um mosquito a mais no grelhador infernal
uma espera debaixo de um candeeiro...
a lâmpada na escura noite soa como um fantasma
não tem mulher nem tem filhos,
não tem família presente
resta-lhe os bêbados nocturnos
que rastejam as suas carcaças
ou então os que metem na veia
- You mother fucker!!!
o candeeiro brilha como um diamante
brilho eterno da electricidade inteligente.
caca de cão estagnada afigura-se na calçada
que a pálida luz ilumina
o que parece um rosto de mulher aproxima-se levemente
é pálida como a neve
segura nas mãos um lobo.
fala e enamora-se do candeeiro solitário
num romance à distância
sempre que se faz noite escura.
valseiam uma dança
cómica dois bêbados que apareceram
acompanhados pelo suave aroma da primavera
nesta balada do candeeiro.

um mosquito eclode de um charco verde,
não mostra ser diferente dos outros
é apenas mais um mosquito.
diz-lhe a lua para que vá falar com o candeeiro, seu amor
- Fala com ele e diz-lhe que o amo.
e assim o mosquito voou e voou
não encontrando o dito candeeiro,
reparou antes numa criança caída a dormir numa cama.

ela dormia com castelos sonhando
com lutas e com espadas
e o mosquito ao sentir-lhe o doce aroma do sangue
lhe roubou umas gotitas
para que enchessem o seu estômado
e na madrugada que se seguiu
já do candeeiro não se lembrou
aninhou-se e esperou a noite cair.

hoje a lua chora
e no seu choro uma praga lançou
ao mosquito que de água nasceu
e lhe matou o calor.

Fantasmas (12 de Setembro de 2006)

as pálpebras abrem-se para recortar a visão do que vejo.
pessoas, coisas, carros, cidades...
miro fixamente o que de mim consegue ver
perdendo-me num instante nos fantasmas,
prestígio da nossa existência corpórea...

rio-me da estúpida sintaxe com que Platão me tenta impingir
interrogando-me qual de nós terá razão
sentamo-nos.
duas cadeiras prestam-se aos nossos serviços -
espero que fale.
nada do que me diz me interessa e amaldiçoo-o a ele e à sua caverna.
observo-o falar porque os meus ouvidos se fecharam
restando apenas na memória uma campainha de elevador
observo a sua boca mexer-se,
reparo que tem três dentes cariados.
súbita e inesperadamente levo com um banho de vinho do Porto sob a minha camisa branca
o empregado, envergonhadíssimo pede mil desculpas
irritado - ou dando ares disso - desnudo o meu tronco
peço que me mandem lavar a camisa
- apesar de tudo isto Platão não interrompeu o seu discurso um momento
sobre-me estômago para mudar de mesa;
o fantasma roga-me uma praga que acrescento ao meu livro negro.
tomo uma aspirina para me manter a depressão.
- Um café, por favor.
agora terei de esperar pelo menos uma hora pela minha camisa.
pobre dela, pensar que me custara os olhos da cara
vou aos toiletes e lavo a cara
os meus olhos não conseguem manter-se abertos e ainda tenho mais 45 minutos
banho o meu pescoço com uma onda de água fria
olho as minhas pálpebras notando o negro das olheiras
- Oh, tempo de ir!
pelos poros da minha pele irrompe tinta negra.
com as mãos procuro remover essa espécie de melaço
mas quanto mais removo, mais a tinta se compõe em desenhos negros
deixo-me ser revestido de tatuagens enquanto a cafeína toma efeito
as minhas unhas projectam-se para além da realidade
e o meu espírito projecta-se num outro eu
ele veste uma camisa branca lavada, engomada
os seus olhos estagnados de ódio e de vingança atiram-me para o canto da retrete
abre o fecho das calças e mija no chão
eu agonizo.
ergue-se ante mim com uma altivez de um Luís XIV
eu amargo a um canto como um mutilado Quasimodo
um ódio, uma raiva de ele não sair dali.
já no café vira uma mesa para o chão.

devoro o remorso de raiva de não ser ele
e no entanto é ele e eu ao mesmo tempo
ele já não está aqui
e eu sinto que fiquei doido no total
peço um copo de vermute
o meu corpo acumula suor na epiderme
os meus pêlos aconchegam-se de frio
sonho tomar um forte ácido para derreter a digestão
que me remoi as entranhas
reparo que Platão está ao lado de uma rapariga
nada lhe diz.
quem lhe fala é Napoleão
como anjo da guarda acompanha-a o sábio Platão.
esqueço o mundo que me detesta e peço mais vermute
vomito tudo o que tenho e chamo por Galileu.
peço-lhe que vá à N.A.S.A. e me construa um foguetão
diz-me não saber o que é.
berro por Elizabeth
a raínha, frígida como sempre, aparece mas nada me diz.
senta-se ao meu lado e jogamos uma bisca.
farto-me da coisa e chamo o Pitágoras
ele aparece com a minha camisa
- Finalmente vestido -
saio do café-

a intelectualidade dos escombros de certas cidades revolvem-me os olhos ja de si tão enevoados.

Sunday, August 19, 2007

registo o mundo que é meu com um pequeno bloco de notas que não tenho.

Thursday, August 09, 2007

tanto quanto me consigo lembrar esta cidade tem sido a morte em pessoa. todos os dias passo por cadáveres de pessoas que se arrastam numa azáfama descomunal para conseguirem o seu quinhão de existência. escondo-me entre as mil pessoas, não quero ver ninguém e ninguém me quer ver. a minha existência é tão enormemente triste que tudo poderia chorar. mas não chora, eu não deixo. sou o cúmulo do egoísmo a ponto de não deixar a ninguém as minhas dores e as minhas tristezas. as vidas que passei não voltam mais, os pequenos prazeres que tinha foram todos consumados pela vaca grande no deserto, o meu ouro apodreceu...
nunca soube bem o que era viver. e cada dia que passa sei ainda menos o que é isso; porém, agora, tenho a noção de que não sei viver... que mais resta? que mais se pode ter se queremos dizer a nós mesmos que existimos pura e simplesmente por existir. dá-nos um ar de vazio, um ar de que somos ainda mais pequenos que somos na realidade; ainda assim temos de continuar a arrastar-nos e levantar os nossos lamentos ao céu esperando que de lá chegue alguma resposta.

hoje, tenho a ligeira sensação de que terá sido hoje mesmo, o mundo não mundo não mudou radicalmente, as pessoas que era suposto morrerem morreram, os outros continuam vivos, talvez tenha havido um massacrem em alguma localidade do planeta ou simplesmente isso tenha acontecido na minha cabeça. hoje mesmo o mundo permaneceu igual ao que era, eu permaneci sensivelmente o mesmo.

Wednesday, August 08, 2007

essa rosa orvalhada




essa rosa orvalhada
que frio nada teme,
é brancura alva pintada
com o meu brando choro.

choro e ela me toca
levemente, como que não foi
mais que um suspiro
e ainda assim aconchegante.


minha rosa orvalhada
porque andas assim
tão morta quanto eu
deitando águas por mim.

espero-te


espero-te aqui
no fundo
neste quarto frio.

desejo
os meus lábios
secarem
de tanto beijarem
o teu corpo

sim,
eu espero por essa manhã.

espero o sabor quente
do teu calor,
de ti.

sim, espero
sem pressas
esse momento único
de me dizeres ternamente
ao ouvido:
é agora.

permaneço
neste quarto frio
reflexo
do inverno
em que vivo.

espero-te
espero-te e espero-me
aqui, tão perto
e mesmo assim
somos longe.

Tuesday, August 07, 2007

o ar que respiro não é mais que um conjunto de palavras a sufocar-me. mesmo quando não tenho nada para escrever, quando não percebo o que digo, apenas sei que tenho de o dizer. as folhas com que escrevo tornaram-se fantasmas que me perseguem para que continue a escrever. por vezes escrevo coisas bonitas. por vezes não sei se são bonitas, alguém que as aprecie. escrevo quase,por vezes, quase como se fosse forçado, por um invisível mestre a continuar a escrever. escrever, escrever, escrever, ler, escrever, parece que as letras me perseguem. com elas se pode fazer uma coisa interessante, com elas se podem construir mundos bem bonitos, com elas se pode defender uma pessoa, ajudar outra. mas são a minha maldição.
sinto-me como se fosse um herói de uma história de banda desenhada que perdeu a capacidade de agir no bem por fazer bem à humanidade, penso que sou forçado a isso, forçado a arranjar mais umas letras e a alinha-las e deslizar a minha mão por elas. todas elas são uma realidade que acabo de inventar, nada do que digo é real e ainda assim sinto-o real.

leite coalhado


ouve-me esta última vez
sente o que te digo
que só de te querer
vejo o meu corpo se perder

quantas vezes pensei ver
teu rosto nas rosas
quantas mais sonhei
ver o amor que te deixei

embora durmas onde sonhei
ouves sem querer
num sonho cerrado
palavras que hei imaginado

fugi para o mar coalhado
charco que fizeste
na tua investidura
prazeres, carne feroz, dura

o tempo não mais passa, dura
seca as lágrimas
e fica a dor sozinha
âmago em mim flor cega minha

Saturday, June 30, 2007

meus olhos em pérolas feitos, baços como neve

olho cadáveres apodrecendo,
não mo permitem aos vivos.
é como se o olhar matasse
aquele que matar se quer
ou de olhar se sujassem
as mãos de um crime inocente
em dormindo eu tem lugar

concedem-me tempo e vejo,
algo como um horizonte
algo perdido num Gólgota.
vejo minhas mãos carnais
envidraçando-se como olhos,
meus que de tanto chorar
perderam a capacidade de olhar.

Tuesday, June 19, 2007

ofícios em retrospectiva

vejo que nada sinto, vazio
que minhas pobres mãos
tão vazias, abandonadas
rezam para terem vida
viajam pelo couro solar
de um cavalo feito eu
pesquisa de coisa nenhuma
cavalo de bronze em brasa
um solstício em declínio
uma morada ausente das cartas
e ainda assim tenho mãos
sejam elas cortadas de mim
mais que tudo quero vida
em esta morte desesperante
que profundo seca corações
faça-se em mim esse solo
essa luz que brilha no alto
e ilumine o meu caminho
oculto em copos de brandi
mãos que tão mortas viajas
pelas brumas de um ser
que habitas a calma de viver
sem que vida saibas ter
abres a janela e regas o vaso
tomas banho e secas o corpo
mãos que não sabem fazer trabalho
trabalho que de homens sendo
de homens não sabe fazer-se
e escolhem esconder-se
mãos que não sabem falar
como a língua sabe dar
escondem as palavras que esquece
essa boca tão veloz, fugidia
entrega-se ao calor ao frio
e nem nisso tem valor
minhas mãos não valem nada
mais valia que mas cortassem

não escreveria eu isto...

ausência - um soneto disforme

só porque não estás aqui a tua presença me falta
só porque não podes é que sinto que não sou teu
só por não teres vida para mim me sinto sozinho
só por todas as coisas que me dizes sou mais feliz

às vezes procuro um instante de ti comigo ao lado
às vezes dou por mim a cheirar a tua usada roupa
às vezes sinto que queres algo e não sei como agir
às vezes tenho medo de falhar e penso que falhei

e, no entanto, é apenas mais uns instantes sem ti
tal como muitos outros dolorosos e convidativos
que me chamam a sofrer mais um pouco talvez...

espero que venhas e mais o ainda distante tempo
e sofrer parece mais doce só por te ter à espera
e enquanto sofro ardo em prazer de tua presença

equações de milésimo grau


P. é como se fosse o pai do grupo.

J. é o intelectual.

M. é o mais libertino de nós.

A. é o mais velho.

D. é o mais doido.

R. é o talvez o mais distante de alguns de nós.

I. é o mais novo, aquele que tem ainda muito que aprender.

S. o que de nós se afastou por esta ou por aquela razão.

F. o que neste momento só diz mal de M.

T. o que junto com F. inventam histórias o mais malucas que se possam imaginar.

V. o que soube por T. que D. e M. supostamente namoravam.

P. o que disse a D. que S. e M. tinham estado os dois juntos quando S. namorava R.

L. namora actualmente S.

W. esteve com S. uma vez.

Y. viu há dias W. com S., estando S. a namorar L.

O. gosta de D., mas D. não que namoro com O. mas antes com H.

Q. gosta de I. mas não o admite, disfarçando.

Q. conhece H. e diz isso a I.

I. quis namorar com O. mas O. não quis porque O. gosta de D.


complicado? experimentem ter a minha vida...

Sunday, June 17, 2007

sem mais que...

borboletas na minha rua não mais têm onde ir que não seja a minha casa. dançam em corropio em torno de jorros de leite e fel, jorros de vulcões viscerais pensando alcançar o cimo da pirâmide... ouvem-se noticiário de manhã à noite e eu penso para mim mesmo que estou cada vez mais maluco e que tudo o que sabia já deixou de ser conhecimento e passou para a ala do esquecimento. entretenho o olhar nessas borboletas maravilha dos ares que, por não serem Ícaro não voam alto demais. os sonhos, as palavras, as ideias não são mais que ejaculações da copulação de mais ideias que temos e que se umem para tentar criar a nossa ruína. olho as borboletas para me lembrar que elas não têm para onde ir e eu tenho semrpe algum lugar onde ir, alguma coisa que fazer sem conseguir escapar-me da campânula de vidro que sou eu mesmo... o que fiz eu para agir da maneira que ajo? que fiz eu... entras de rompante no quarto onde o meu olhar vagueia com as borboletas e me deixo inundar pela sua cor, podem não ser bonitas, mas eu gosto delas na mesma. vens e deitas-te ao meu lado. o teu olhar cansado, ausente adormece quase instantaneamente e eu perco-me a olhar-te. olho-te, olho-te até as minhas lágrimas secarem. olho-te para me lembrar que te amo pois a tua presença na minha vida já mal se faz sentir...
silencio
parece que a tempestade passou e posso enfim dormir... as borboletas sairam já também e estamos nós os dois sozinhos. o vento espaneja as cortinas da janela aberta que os nossos olhos vêm. o gosto, o paladar, a musicalidade das palavras que me dizias (como me lembravam um velho porto servido em copos do vidro mais puro) desapareceram como se sublimassem e o éter da nossa paixão foi-se evaporando dos nossos corpos cansados de foder e de beijar. parece que o amor nos esqueceu, que o amor para nós morreu...
silencio
os teus cabelos derramam nódoas negras nas ranhuras da trama dos lençóis da almofada em que repousas. parece que têm vida e se vestem de serpentes para reclamar os corpo que é seu e que a ele não tenho tido acesso. os meus ossos vibram como canas, como varetas de um diapasão fazendo soar ondas puras, que puro maior não existe e eu apenas quero agora dormir, não quero pensar em ti e a tua sombra me persegue. o quarto é um espaço vazio onde me abandono ao teu domínio que farpeia a minha pele morta...
silêncio
espalhas raízes à minha alma desesperada feita pão bolorento. nela pousa uma última borboleta fazendo um esforço para não me achar uma peça nojenta. ao vê-la masturbo-me em desespero contínuo procurando uma última gota do que pudesse existir entre nós. o que sinto não é mais que uma decepção, uma profunda bebida amarga do fundo de uma garrafa cujo prazo ja acabara e azedara. nem para vinagre servimos. a nossa alma conjunta morreu, as nossas memórias foram queimadas, a nossa cama se keimou e morremos...

Saturday, June 16, 2007

manhã de limpeza

enternecidamente olho a janela procurando a beleza de um instante nesta manhã tão submersa em remoinhos e raivas. socumbo a cada instante por uma pequena gota a mais desse teu perfume tão intenso como a noite da minha alma que te repousa em um sono profundo. os meus dedos tacteiam os límpidos poros da tua sede de sonhar. não sonhas - não sonhes, não quero que partas da minha presença para te encontrares com os teus semelhantes.
o teu peito robusto como um escudo oferece-me uma segurança que não consigo alcançar e as tuas pupilas não são manhãs ainda - era meu desejo fazê-las raiar. o teu sono faz-te perderes nas mangas da minha sedução e a dissoluta vontade de ser teu invade o meu espírito - meu deus como abomino as paredes entre nós, entre os teus modos e as minhas segurnaças irreais.

sem me aperceber como estou nu numa paragem de metro com vários fotógrafos a retratarem-me nas suas películas instantâneos da minha vida. e na boca sinto ainda o teu suor, os teu beijos feitos brancura da alvorada. danço freneticamente na minha tão negra dos nossos atrevimentos e das nossas diversões nocturnas, ainda me lembro de quando te arranquei de casa dos teus pais para vires comigo e no combóio chocámos toda uma carruagem só porque nos beijávamos intensamente e eu tentava tirar-te a camisa que trazias já colada ao corpo pelo suor de apanharmos transporte. na retrete vimos um preservativo redemoinhar pacientemente de algum passageiro que, à semelhança de nós desejava prazer... eu apenas te queria comigo, a meu lado a devorar todas as maçãs da árvore do conhecimento divino com o leite de mel dos deuses a irrigar a nossa guerrilha.
os estranhos que nos miravam como câmaras de filmar eram para nós paisagens em declínio nesse inverno de incertezas - oh quantas não tivemos nós... só de lembrar que não querias tocar-me e aprender-me em prazer.
às nove em ponto aparece a empregada. a limpeza dos quartos e das provas da nossa existência carnal são apagadas da memória dos estranhos e o brilho dos cristais faz-se ver novamente. a cidade, inaculada de pecado privado solta para a rua as suas curiosidades de manhãs a raiar um sol negro, sem sabor e nós limpamos a vida, as nossas preocupações nessa mesma cama, nessa paragem de metro ou no combóio pendular.

Sunday, June 10, 2007

eternis

sempre a lembrar-me que nasci num dia estranho
pensando nas coisas que são me hão-de sair
fujo dos livros que me obrigo a escrever
para todo o sempre em paz perecer
vejo-me em grande perturbação
sonho uma grande inundação
só para que encontre algo
para ver se o apanho
e torno mais minha
minha vontade
de perecer

Monday, May 21, 2007

Vaidade

Sonho que sou a Poetisa eleita,
aquela que diz tudo e tudo sabe
que tem a inspiração pura e perfeita,
que reune num verso a inensidade!

Sonho que o verso meu tem claridade
Para encher o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a terra anda curvada!

E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto vou voando,
Acordo do meu sonho... e não sou nada!...

Florbela Espanca

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 5, o último)

ora bem... antes de mais como é normal acontecer neste ciclo, a sessão começou atrasada, em parte devido ao facto de a pessoa responsável ter vindo alguns minutos antes (meia hora). Conhecendo já do ciclo anterior que decorrera em Novenbro, a verdade é que não digo que tenha sido culpa dele, uma vez que sei que se ele soubesse que iríamos passar um filme em formato divx teria vindo às 20 h em vez de vir às 21.
O pessoal teve de ficar um pouco de tempo à espera. Este que fora o último dia foi também do que teve mais gente. Foi exibido o filme "Get Real". Não me consigo esquecer do título em brasileiro: saíndo do armário lol.
Infelizmente o filme não tinha legendas por problemas técnicos, o que é sempre uma chatice pois uma das pessoas, pelo menos, não sabe inglês e, se calhar algumas das outras não estariam habituadas... as minhas desculpas.
de
qualquer forma foi um dos filmes que pensei em exibir no ciclo anterior e que passou neste, retrata a história de um gay que começa a sua vida como homossexual num meio onde há uma constante repressão, muitas das vezes não verbal ou física, mas de ausência de pessoas com quem se possa falar. a verdade é que o filme provocou algumas sensações em algum pessoal que no fim do filme ficaram para comentar. uma delas referiu-se ao facto de que ficou com uma clara ideia do que é ser-se gay e de ter pessoas que as ameaçam. para outras pessoas provocou a necessidade de pensar em leis que tornem muito mais igual este "tipo de pessoas diferentes". a verdade é que existe em portugal leis que têm posições homofóbicas (como a lei que regula as fecundações in vitro) e que é preciso retrabalhar.


em jeito de conclusão a este ciclo digo apenas uma frase: foi apenas algo feito como costuma a ser feito em coimbra, ou seja, algo feito em cima do joelho pela boa vontade de algumas pessoas enquanto que as que eram suposto estarem mais envolvidas no evento não o fazem...

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 4)

Ora bem a epopeia de filmes a serem exibidos neste que é o segundo ciclo de cinema LGBT em coimbra é um evento que merece toda a atenção. No segundo dia em que o filme exibido foi substituído por um outro com legendas em português foi no mínino cosntrangedor.
de entre três filmes que havia para escolha, esta recai sobre rent (escolha essa que fora em grande parte feita por mim). um filme que me arrependo sinceramente de que tenha passado... mas pronto, de águas passadas. este filme é baseado num musical que fora baseado na ópera "La vie Bohémme" (tanto baseado). pouco tempo depois do filme ter começado notei logo que a escolha fora um tanto ou quanto infeliz e que o raio dos gajos não se calavam com as músicas que metiam bateria e guitarras a torto e a direito. Maldigo, não só o realizador, mas também o criador das músicas que me fizeram passar 2.5 horas a aturar cenas cada uma pior que a outra. Dos poucos momento que vale a pena ficar é a cena do tango, a morte do Angele e o seu funeral... mas poupem-me, lembrar-me daquela música dos 525 600 minutos... não há que a ature!
Sendo um musical pouco tempo depois de a sessão ter começado algumas pessoas saem e ficam apenas meia dúzia a ver o resto

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 3)

O filme de hoje foi o "Casa no Fim do Mundo" um filme feito a partir da obra com o mesmo nome que um livro do Cunningham, autor do livro "As Horas". Não me refiro em nada de especial do filme uma vez que a adaptação não fora nada de mais. Aliás acho que foi muito soft em termos de alguns episódios assim como de sentimento.
Por mim o melhor momento do filme foi a relação que os dois protagonistas tinham com a mãe de um deles. No livro isso chega ao ponto de um deles querer fazer sexo com ela.
De resto há que referir que o filme que inicialmente estava previsto para este dia era o "Porquoi moi?" de qualquer forma alguém se lembrou de escolher um filme sem legendas em português e isso foi vetado para que fosse substituído. Na exibição do "Casa no Fim do Mundo" tem-se a particularidade de as pessoas da secção de estudos cinematográficos não estarem a horas decentes para preparar a sala para a sessão de cinema e as coisas são sempre à última da hora. Uma das situações que se verificou foi que o filme foi esticado para os lados ou para cima e tinham-se pessoas muito magras ou ligeiramente mais gordas do que ja são.

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 3)

Thursday, May 17, 2007

17 de maio

só para lembrar que hoje é o dia (não oficial) da luta contra a homofobia. não pretendo mais nada que lembrar que todos os dias somos confrontados com isso...

Wednesday, May 16, 2007

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 2)

como houvera dito, as complicações neste ciclo de cinema não haveriam de acabar. em primeiro, eram nove horas, meia hora antes do começo da sessão e era suposto haver pessoal do centro de estudos cinematográficos na respectiva sala para que se pusesse o filme a correr e se fizessem todos os testes. como bom português que se preze, chegar a horas ou uns minutos depois é coisa que convenha e o ciclo, como sempre em coimbra, começou com a hora um pouco mais adiantada.
em segundo, os testes antes de a sessão começar têm uma vantagem, evita-se que o filme tenha de começar três vezes por causa de questões de som.
depois de todos estes precalços, começa então a história do filme que tem o nome de "Boys Don't Cry", película baseada numa história verídica acerca de Teena Brandon, uma rapariga que já há muito que se sentia um rapaz. esse papel coube a Hilary Swank (a actriz que protagonizou o "One Million Dollar Baby") e que neste seu papel de 1999 mostra as suas boas qualidades como actriz.
a história é, algo pesada e pejada de vários elementos que provocas as pessoas, quer seja pelo facto de existirem várias cenas sexuais que são trabalhadas de forma particularmente interessante, quer pelas várias cenas algo violentas. aliás a "família" de Lana era algo de muito peculiar e o final era o esperado, e que só poderia ser dessa forma.

Tuesday, May 15, 2007

2º ciclo de cinema lgbt em coimbra (dia 1)

- porque é que escreves?
- por vingança.

evento em coimbra que se preze tem de ter sempre duas coisas a acontecer: chatices porque há alguma coisa em falta mas lá há alguém que viola uma regra ou que por boa vontade a arranja e começar com uns minutos de atraso.
foi assim que começou um evento que, apesar de pouco divulgado, mostrou ter público. a afluência não fora tão grande como no evento anterior, de qualquer maneira, várias foram as pessoas que se deslocaram ao pequeno auditório da aac para assistirem ao filme "antes que anoiteça" do snabell. este filme tem a pecularidade de retratar a história de Reinaldo Arenas, um cubano que tinha três pequenos problemas: era escritor, dissidente e homossexual. um filme baseado na obra homónima de um escritor que passa parte do seu tempo a sobreviver primeiro em Cuba e depois em Miami, onde viria a suicidar-se. depois de algumas lágrimas caídas por certas cenas do filme, assim como uma gargalhada devido a uma das personagens interpretadas por Jonny Depp, seguiu-se uma pequena conversa onde se reforçou a ideia de que a se pretende este ano no dia (ainda não oficial) mundial da luta contra a homofobia, de assinalar os países onde é crime ser-se homossexual. é o caso de cuba.
o filme, apesar de longo é daquelas coisas, vale a pena passar os olhos pela coisa... até porque tem boas interpretações (o jonny depp no seu melhor, qual eduardo mãos de tesoura, qual quê!!!!!!) assim como interessantes caracterizações (o raio do Jonny Depp não me sai da cabeça :p) e uma banda sonora interessante.
e pronto, após quatro tentativas de por o filme a correr, de se ter ou não pedido certas autorizações, de se correr o risco de o resto do ciclo ir por água abaixo, lá se fez o primeiro dia, que não será, com certeza o dia mais interessante do ciclo, fica-se por ver o resto.
há lugares onde ninguém deveria ir sozinho
onde as nossas barreiras se quebram e vaga
o espaço numa leve melancolia a arder

uma dor alucinante cheia de impiedade
algo tão silencioso como só um grito sabe ser
e de tanto doer passa e nem notamos afastar-se

como essa dor é tão minha, oh, essa dor
e eu não ser esse tão esbelto apolo que se afigura...
rasgando os céus nesse carro ardente

não quero eu ir para casa
não quero ter mais lágrimas
ou outras dores estampadas
em um rosto doce feito fel
com a mágoa acorrentada
posso jurar nunca ninguém
vi que olhos chorassem tanto
como os meus que tão lavados
secaram, assim é o poeta
que chora por ter de chorar
sonha sem nunca acordar
vindo sempre de um lugar
onde fica a hora é incerta
e o desejo ardente marado
um lugar onde tudo é tão extenso
feito longe, feito mar de incenso

Monday, May 14, 2007

depois de ter saído de casa J. apercebeu-se que as chaves tinham ficado em cima da cómoda. isso era crítico, logo hoje que estava atrasado para o trabalho... teria de arranjar uma solução o mais depressa que pudesse. teria de ligar à empregada que vinha hoje e perguntar-lhe se poderia vir mais cedo. telefonaria também para o seu patrão a avisar do atraso. a empregada não viria e ele não conseguiria chegar ao trabalho. amanhã por esta mesma hora estaria a levantar-se para não fazer nada mais que esperar o tempo passar.
"há cinco anos que me sinto completamente sozinho... há cinco anos que não visito os meus amigos e por eles fora esquecido... há mais tempo ainda... oh... há quanto tempo... não tomo eu um copo com os meus amigos."
a verdade é que ele bem sabia que não valeria a pena ressentir-se com isso, ele seria sempre o mesmo, ele não conseguiria voltar a renascer, por muito que isso fosse bom e prometesse. há muito que se acomodara e não esperava que o ajudassem a ter de novo a vida alegre que tinha nessa altura.
a verdade é que os tempos mudaram e o momento das borgas tinha passado e nada mais restava que fazer o que fosse possível para arranjar dinheiro e sobreviver mais um pouco neste mundo cruel.
a verdade é que os seus amigos se fartaram de o convidar para sair quando ele dizia que não tinha dinheiro para tomar copos ou que não se sentia bem por lhe pagarem sempre as noites de bebedeira pelas quais passava.
a verdade é que era um adulto, assim como todos os seus amigos e tinham famílias a sustentar. ele não, nunca se afeiçoara a ninguém o suficiente para que isso acontecesse e arranjara-se como pudera, sozinho como sempre se sentira.
a verdade é que tinha preguiça em procurar velhos contactos. e já nem a promessa de bom sexo o motivava a sair de casa para um filme ou uma saída, por mais rápida que fosse que o desviasse do seu caminho: trabalho-casa, casa-trabalho. era por essa razão que as reuniões de trabalho eram para ele um motivo de preocupação.

neste dia não valia a pena apressar-se para chegar a horas ao trabalho, pois nunca chegaria a horas... hoje não valia a pena... porque é que tinha feito aquele telefonema ao seu chefe, se sabia perfeitamente que não conseguiria chegar da parte da manhã ao gabinete onde ocupava os seus dias. nesse dia de que lhe valia...
"pensando bem não tenho vivido nada... que tenho eu feito que não seja ir para o trabalho e fazer o que me compete. não tenho perspectivas de subir, mas também não tenho de descer, sou bem visto, mas ao mesmo tempo não tenho perfil para dirigir pessoas..."
J. não sabia o que fazer da vida nem o que pensar... era daquelas pessoas que se camufla no meio de toda a gente e que tem um pouco de toda a gente e não tem nada de ninguém... um incógnito... passava por milhares de pessoas por dia mas sempre que olhava para elas lhe pareciam distantes, inatingíveis. desejava misturar-se com elas... ser parte da sua vida e não apenas uns meros pontos na história desta cidade. nem no trabalho olhavam para ele como uma pessoa, apenas como um empregado e, nem mesmo a secretária do seu gabinete, que bem feia era, lhe convidara para um café na esquina mais próxima. os seus chefes olhavam para ele como qualquer chefe olha para o mais insignificante dos seus empregados. os seus colegas de gabinete passavam por ele como se nem se apercebessem de que ele existia para além dos limites do gabinete. neta cidade tudo lhe era estranho... desejava alguma cor... nem que essa cor fosse o breu. desejava uma pequena constipação, não para falhar no trabalho, que era o mais preciso possível, mas para que fossem dias diferentes. depois punha-se a pensar... "mas quem pode cuidar de mim que não tenho ninguém que se lembre de que existo?" a altura do ano que mais o aborrecia era o mês de agosto, altura que passava o tempo à espera que o tempo passasse para ele voltar a fazer a viagem para o trabalho. nessas alturas ele inventava que viajava por aquela cidade em que morava e trabalhava. passava pelas ruas que percorria e que conhecia todas as pedras e ladrilhos... demorava precisamente o mesmo tempo a percorrê-las em pensamento que demorava a percorrer na realidade, pois nada mais sabia do mundo que os seus dias nesse vai-vem eterno de casa para o trabalho e vice-versa. hoje olhava para ar e encontrava pássaros que o saudavam como uma pessoa que conheciam de longa data mas que ele não lhe tinha ligado nada. as árvores estendiam as suas folhas para que ele pudesse passar por cima delas e os raios de sol brilhavam como se pretendessem aumentar-lhe o esplendor. e ele olhava tudo isso agora que não podia voltar a casa nem podia ir para o trabalho. andou um pouco mais e descobriu que se estendia no seu caminho para o trabalho um pequeno jardim com árvores e bancos relaxantes. era tudo o que precisava agora. sentia-se um pouco cansado pois percorria um caminho que não conhecia, mesmo que esse caminho fosse o mesmo caminho para o trabalho, o caminho que conhecia tão bem, mas a preocupação das chaves deixara-lhe espaço para fazer maluqueiras.
J. senta-se no banco do jardim e nesse preciso instante é bombardeado com caca de pombo. olha para o casaco sujo e nem se preocupa com isso... a verdade é que o mundo não o perturbava agora... o seu fascínio por tudo aquilo era grande demais para toda a vida que o rodeava. o seu telemóvel tocava insistentemente do trabalho e já alguém no seu gabinete pensara que alguma coisa de mal lhe acontecera... mas não havia nada de mais... deixou-se ficar, largou o telemóvel e manteve-se estático no banco de jardim.
J. nem sabia porque é que não tinha ido para o trabalho na mesmo e ligara à empregada a dizer que deixasse lá a chave. ela bem que o poderia fazer... assim ele estaria naquele momento a trabalhar... mas se assim fosse ele não estaria maravilhado com o mundo à sua volta e não haveria história pois seria um dia igual a tantos outros. restar-nos-ia apenas dizer que ele fora para o trabalho onde preenchera vários papéis e assinara uns quantos de documentos e passara declarações até à hora marcada, altura em que largava o trabalho e vinha para casa. em vez disso deixou-se ficar a olhar para tudo o que acontecia no parque; para as árvores, para os pássaros, para as crianças, para os idosos, para toda a gente que passava, marcando cada uma como se fora um documento único para guardar para a posteridade. cada rosto era único, cada olhar era uma completa ficha de identidade. o andar de cada pessoa explicava mais algo da sua vida, como se fosse necessário registar todos os detalhes para um crime que ocorrera. a um dado momento nada mais fez que deixar-se ficar quieto, sem olhar, com a vida a escoar-se.
J. nunca soubera como o mundo cruel poderia também ser perigoso e esse esquecimento fizera-o baixar armas num local perigoso. os jornais do dia seguinte iriam relatar a morte de uma pessoa nesse parque onde anda tanta gente. tudo para que alguém encontrasse alguns trocos para comprar droga... ele nunca trazia dinheiro e o carteirista não era experiente e preferia matar a roubar... "gostava de lhe ter dito que não trazia dinheiro na carteira... sempre poderia ficar mais um tempo a observar o parque e a descobrir mais coisas nele..."

Friday, April 27, 2007

escritor das coisas incompletas

às vezes sou invadido por uma estranha sensação de completa incapacidade de conseguir fazer o mundo parar de girar. o deserto que assola toda a nossa vida nada mais nos trás que a triste lembrança que estamos vivos para amanhã morrer. sobram-me as minhas mãos, mas que mãos são estas que parece que tudo o que tocam se desfaz como se fosse um toque de algo parecido com um rei midas? os meus sons elevam-se até ao cimo da minha alma para produzirem algo de grande que não consigo ainda vislumbrar. o maravilhoso preenche a minha vida para me lembrar que devo ter esperanças para o que vem. no entanto, em certas noites sozinho, neste quarto escuro, sou invadido por uma súbita sombra que me deixa mais pequeno que um recém-nascido.
as minhas mãos muitas vezes destroem, as minhas mãos, na maioria dos casos deixam as coisas incompletas para depois dizerem que são mãos que trabalham, que fazem muito... os outros é que não lhe reconhecem o verdadeiro mérito. sou escritor porque gosto de exercitar a escrita. mas será que algum escritor pode dizer-se escritor quando o que escreve é sempre incompleto, imperfeito? Sou autor de obras inacabadas que dificilmente serão concluídas. muito dificilmente alguém irá olhar para este diário e pensará que terá algum valor literário quando nada mais escrevi fragmentos do que poderiam ter sido livros, mas que não chegaram ao fim.
um dos meus desesperos dá pelo nome de "verão: dois num quarto" penso nesse texto como talvez um arrojado ensaio para escrever algo mais sublime e apesar de metade estar ja escrita, não lhe consigo escrever a outra metade, o que a desejaria escrever... sei que esse texto não daria para ser publicado, pelo menos para já, mas mesmo assim sinto-o como um peso atrás de mim que não consigo aliviar. pode ser que um verão destes acabe por me sentar a acabar algo que neste momento sinto inacabável, mesmo que dele já tenha final. julgo que não consigo ressuscitar o André e fazer com que ele desperte do sonho que tantas noites o devorou. quanto ao pedro, acho que se virará eternamente para a amargura no interior do quarto, chorando. quanto à rapariga... essa acho que o seu verdadeiro papel nunca será revelado mesmo que o quisesse e permanecerá no incógnito. que fazer disto?
mesmo para este texto deveria escrever mais e não sei como terminar, vejo luzes e não sinto que ninguém apague esse interruptor que escreve sem parar mas que nada mais.............................

Monday, February 12, 2007

enfim o mundo é redondo e nós nele...

Wednesday, January 31, 2007

Fantasmas de uma cidade 12-Set-2006

As pálpebras abrem-se para recortar a visão do que vejo.
Pessoas, coisas, carros, cidades...
Miro fixamente o que de mim consegue ver
Perdendo um instante nos fantasmas
Prestígio da nossa existência corpórea.

Rio-me da estúpida sintaxe com que Platão me atinge
Interrogo-me quem tem razão.
Sentamo-nos.
Duas cadeiras prestam-se aos nossos serviços -
Espero que fale.
Nada do que ele me diz me interessa e amaldiço-o a ele e à sua caverna.
Observo-o porque os meus ouvidos se fecharam
Retendo apenas na memória a campainha do elevador
Observo a sua boca mexer-se;
Reparo que tem três dentes cariados.
Súbita e inesperadamente levo com um banho de vinho do Porto sob a minha camisa branca
O empregado envergonhadíssimo pede mil desculpas
Irrítadíssimo - ou dando ares disso - desnudo o meu tronco
Peço que ma mandem lavar
- Apesar de tudo isto Platão não parou nem um momento o seu discurso.
Sobra-me estômago para mudar de mesa;
O fantasma roga-me uma praga que acrescento no meu livro negro.
Tomo uma aspirina para me manter a depressão viva.
- Um café por favor.
Agora terei de esperar pelo menos uma hora pela minha camisa
Pobre dela, pensar que me custara os olhos da cara
Vou aos toiletes e lavo a cara
Os meus olhos não conseguem manter-se abertos e ainda preciso de mais 45 minutos
Banho o meu pescoço com uma onda de água fria
Olho as minhas pálpebras, notando o negro das olheiras
- Oh tempo de ir!
Pelos poros da minha pele inrompe tinta negra.
Com as mãos tento remover essa espécie de melaço;
Quanto mais removo, mais a tinta se compõe em desenhos negros
Deixo-me revestir de tatuagens enquanto a cafeína toma efeito
As minhas unhas projectam-se além da realidade
E o meu espírito projecta-se num outro eu
Ele veste uma camisa branca engomada
Os seus olhos estão estagnados de ódio e vingança - atira-me para um cubículo da retrete
Abre o fecho das calças e mija para o chão
Eu agonizo.
Ergue-se com a altivez de um Luís XIV
Eu amargo a um canto como um mutilado Quasímodo
Um ódio, uma raivade não conseguir sair do wc,
Conseguir atirar uma mesa para o chão, mas ele pode.

Devoro o remorço da raiva de não ser ele
E, no entanto sou eu e ele ao mesmo tempo
Ele já não está aqui
E eu sinto que fiquei doido de vez
Peço um copo de vermute
O meu corpo acumula o suor na epiderme
E os meus pêlos aconchegam-se de frio
Sonho tomar um forte ácido para derreter a minha digestão
Que remoi em azia as minhas entranhas
Reparo que Platão está ao lado de uma rapariga
Nada lhe diz
Quem lhe fala é Napoleão
Como um anjo da guarda, acompanha-a o sábio Platão.
Esqueço que o mundo me detesta e peço mais vermute
Vomito tudo o que tenho cá dentro e chamo por Galileu.
Peço-lhe que vá para a N.A.S.A. e me contrua um foguetão
Diz-me não saber o que é
Berro por Elizabeth.
A rainha frígida como sempre, aparece e nada diz
Senta-se ao meu lado e jogamos uma bisca.
Farto-me destas coisas e chamo por Pitágoras.
Ele aparece com a minha camisa branca.
- Finalmente vestido!
Saio do café.

A intelectualidade do escombro de certas cidades revolve-me os olhos
Já de si tão enevoados.

Wednesday, January 10, 2007

O louco

Vivo num mundo cruel sem que a ele me consiga adaptar completamente. Sou um estranho que habita neste mundo esperando que as pessoas me consigam olhar e consigam ver. Sempre o mesmo; parece que tenhgo sobre mim uma máscara que impede todos de me verem, de me escutarem, de me compreenderem.

Nesta imagem que faço de mim espanto-me. Olho para mim como um príncepe olha para o espelho ansiando o dia em que será feito rei. Vislumbro um espelho de enganos dessa terra que prometo e garanto a mim mesmo que existe; sei lá se existe... nem mesmo às vezes me conheço o suficiente para saber se é verdadeira se mentira esta energia que sinto eclodir dentro de mim.

Por vezes sinto nas minhas mãos toda a materialização da ira que tenho acumulado neste mundo sem que dela me consiga libertar, sem que dela abra mão para esse mundo que não conheço nem sei se existe.
Todos os dias brinco com as minhas mãos colocando nelas um poder imaginado capaz de mover paredes, de erguer bolas de forgo e de concentrar toda a energia que flui na alma desse alguém.

Sou um auto-engano, um reflexo irreal de mim mesmo que não consegue vislubrar a distinção entre o real e o imaginário. o poder de uma borboleta que segue sem rumo no mais ofuscante dos meios.

Ele tem garras que me arranham por dentro e me prendem a um estado de ilusão que por vezes rui como um baralho de cartas; por vezes surge como uma súbita onda que me cerca para encontrar em mim alguma coisa de bom no que me rodeia. Eu sou essa eterna criança que teima em crescer; que vê o mundo e espera mais dele do que o mundo lhe pode dar; que anseia por castelos feitos de papel e de nuvens... Que encontra nos seus inimigos seres que consegue derrotar pelo poder da sua vontade, que lhes consegue rotular com uma praga de mau destino, de infelicidades...

Eu sou um monstro encarcerado nessas grades que construo com alegria e boa disposição; eu sou essa besta medonha feita carniceira que anseia sugar de todo o mundo todo o tutano da sua beleza para o concentrar em si mesmo. Sim, sou essas garras, essas lágrimas, esses arranhoes que me destroem...
Eu sou essa pilha de energias que não consegue mais conter mas que vai inchando até à sua destruição total e de todos os que a rodeiam. Não sou feliz sozinho; não consigo ser feliz... Até para morrer tenho de me autodestruir levando comigo almas para serem vítimas dos demónios que me deveriam açoitar...

Não sei...
Parece que no fim de tudo não sou nem esse lado bom nem esse lado mau...
Sou uma ilusão de algo grande...
Sou mais um... apenas isso...
Consolo.