Sunday, June 19, 2011

O Arco-Íris está na Rua - Rainbow is on the Street

Manifesto da Marcha do Orgulho LGBT 2011 de Lisboa

As Marchas do Orgulho LGBT - Lésbico, Gay, Bissexual e Transgénero - acontecem para lembrar o dia 28 de Junho de 1969, data em que, na cidade de Nova Iorque (EUA), no bar Stonewall Inn, homossexuais e transsexuais resistiram colectiva e expressivamente às habituais rusgas policiais, à discriminação e à violência. As mudanças não acontecem “por si”, somos nós que as fazemos e o mês de Junho comemora em todo o mundo as mudanças que vamos tornando possíveis em prol dos direitos das pessoas LGBT, em prol dos direitos humanos, em prol de todas e todos nós.

Vivemos tempos difíceis em que conquistas sociais são hoje colocadas em causa e sabemos que entre as mais afectadas estão também pessoas LGBT, com dificuldades acrescidas na relação com o mercado de trabalho, no direito à habitação, à educação ou a uma saúde condigna. A crise toca-nos a todas e a todos mas poderá também constituir uma oportunidade para um novo tempo em que a Liberdade, a Igualdade e a Solidariedade sejam fundadoras de todas as medidas e a economia seja posta ao serviço do bem-estar das populações.

Liberdade – Liberdade para pensar, agir, amar e sair à rua em comemoração do orgulho pela diferença, das conquistas alcançadas, do ideal de um espaço público que reflicta toda a nossa diversidade.

Liberdade para que possamos construir e afirmar as nossas identidades, viver os nossos amores, a nossa sexualidade, sem papéis e regras definidos e impostos por outrem.

Sabemos hoje que o processo de construção de identidades é variável, que a orientação sexual nem sempre é constante, e que estão longe de corresponder à simplicidade dos binómios homem/mulher, heterossexual/homossexual. E por isso faremos da rua palco de celebração da diversidade dos nossos amores.

Estaremos na rua sempre que for preciso e enquanto for preciso para lembrar que pessoas LGBT vêem as suas vidas destruídas pelo ódio, pela discriminação, pelo desconhecimento, muitas vezes num silêncio imposto pelo medo, pela solidão ou pela vergonha.

As escolas, a par de outros agentes com responsabilidades na educação e formação, são locais fundamentais para aprender a respeitarmo-nos mutuamente, a viver e construir em conjunto, a termos como princípios basilares da nossa acção os direitos humanos, a igualdade de género, a diversidade de modelos familiares e de relações interpessoais. São-no também para a vivência responsável e informada da sexualidade, para uma saúde sexual e reprodutiva plena. Dizemos não à discriminação, ao preconceito e ao bullying homo/bi/transfóbico, que trazem graves repercussões para o bem-estar físico e psicológico, bem como para o aproveitamento escolar, da população jovem, em especial das e dos jovens LGBT.

Igualdade – Igualdade sem ambiguidades, nem hierarquia de prioridades: apenas a igualdade plena na lei salvaguarda os mesmos direitos e deveres de cidadania, e contribui para o fim dos estereótipos, das discriminações, da violência. Igualdade na lei e nas práticas, nos direitos e nas oportunidades para todas as pessoas, em todos os momentos da sua vida.

Igualdade na lei das famílias de pessoas LGBT, com uma legislação que reconheça e proteja as crianças que existem nessas relações. O direito das crianças serem adoptadas por pessoas capazes de lhes proporcionarem condições para uma vida digna não se coaduna com a actual discriminação na lei que impede casais de pessoas do mesmo sexo de se candidatarem à adopção. Ou ainda a impossibilidade de um casal de lésbicas ou de uma mulher sozinha, independentemente da sua orientação sexual, recorrerem a técnicas de procriação medicamente assistida. Estas famílias já existem e as leis têm de mudar no sentido da igualdade.

Sabemos também que as pessoas seniores, independentemente da sua orientação sexual, mas em particular as pessoas LGBT, são discriminadas devido à sua idade, aspecto e capacidades físicas, na sociedade, no trabalho, nas famílias e entre os seus pares.

A lei de identidade de género hoje em vigor em Portugal constituiu um passo muito importante no reconhecimento das pessoas transexuais e das suas identidades. Mas muito mais há a fazer: desde logo, a inclusão da categoria “identidade de género” em todas as provisões legais anti-discriminação, da Constituição ao Código Penal, passando pelo Código de Trabalho. E a absoluta igualdade das pessoas LGBT precisa ainda de muito trabalho de formação em áreas fundamentais como a saúde, a segurança, a justiça ou a área social. Também aqui queremos afirmar a absoluta igualdade das pessoas transexuais, transgénero e intersexuais e a sua capacidade para decidirem sobre as suas vidas e os seus corpos, e condenamos as tentativas de limitação da sua autonomia.

As pessoas LGBT não têm tido respostas adequadas às suas especificidades no que toca ao VIH/SIDA e a outras infecções sexualmente transmissíveis. Reconhecemos a necessidade e a capacidade das pessoas e das associações LGBT de, a partir da sua própria experiência e conhecimento da realidade, ajudar a encontrar soluções e formas de ter melhor sexo com menor risco.

Solidariedade – Solidariedade pois sabemos que as nossas lutas não existem só aqui, à nossa volta, e que a sociedade patriarcal que nos discrimina e agride está espalhada pelo mundo. Sabemos que as guerras, a fome, a miséria, o perigo de catástrofe ambiental, a desigualdade de género, a xenofobia, o racismo, a discriminação de pessoas com deficiência são realidades do mundo em que vivemos e que queremos mudar. Sabemos ainda que os direitos das pessoas LGBT ou das mulheres são por vezes utilizados como factor de superioridade de uma cultura sobre as outras, de uma suposta guerra de civilizações que só podemos recusar. Os direitos humanos não escolhem latitudes, governos, culturas ou línguas. Os direitos das pessoas LGBT não existem independentemente do seu direito à livre expressão, a uma educação de qualidade, a uma vida em paz.

Liberdade, Igualdade e Solidariedade porque são princípios dos mais elementares da espécie humana, onde todas e todos nos reconhecemos e porque são essas as cores da bandeira arco-íris que hoje levantamos.

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Manifesto of the LGBT Pride March 2011 Lisbon

The Pride LGBT - Lesbian, Gay, Bisexual and Transgender - happen to remember the day June 28, 1969, when the city of New York (USA), the Stonewall Inn, gay and transgender legal and withstood significantly the regular police raids, discrimination and violence. Change does not happen "by itself", that is we do and the month of June celebrates the world changes that will make possible for the rights of LGBT people in human rights, in favor of any and all of us .

We live in troubled times in which social achievements are now under challenge and we know that among the most LGBT people are also affected, with increased difficulties in relation to the labor market, the right to housing, education or a decent health. The crisis affects us all and all, but can also be an opportunity for a new era in which freedom, equality and solidarity are the founders of all the measures and the economy is put at the service of well-being of populations.

Freedom - Freedom to think, act, love and go out in celebration of pride in the difference of the achievements, the ideal of a public space that reflects all our diversity.

Freedom for us to build and affirm our identities, to live our love, our sexuality without roles and rules defined and enforced by others.

We now know that the process of identity construction is variable, that sexual orientation is not always constant, and that falls far short of the simplicity of the binomial man / woman, heterosexual / homosexual. And why do the street scene of celebration of the diversity of our love.

We will be in the street when needed and as long as it takes to remember that LGBT people see their lives destroyed by hatred, discrimination, through ignorance, often in silence imposed by fear, loneliness or shame.

Schools, along with other staff with responsibilities in education and training, are key sites for learning to respeitarmo one another, to live and build together, the terms and basic principles of our action human rights, gender equality, diversity of families and relationships. They are also responsible for the experience of sexuality and informed for a full sexual and reproductive health. Say no to discrimination, prejudice and bullying homo / bi / transphobic, bringing serious consequences for the physical well-being and psychological as well as academic outcomes, youth population, especially young people and LGBT.

Equality - Equality unambiguous, no hierarchy of priorities: only full equality in the law safeguarding the rights and duties of citizenship, and contributes to the end of stereotypes, discrimination, violence. Equality in law and practice, the rights and opportunities for all people, at all times of your life.

Equality in the law of the families of LGBT people, with a legislation that recognizes and protects children who are in these relationships. The right of children to be adopted by people who can provide them conditions for a dignified life is not consistent with the current law that prevents discrimination in pairs of same-sex couples to apply for adoption. Or the impossibility of a lesbian couple or a single woman, regardless of their sexual orientation, using techniques of medically assisted procreation. These families already exist and the laws must change towards equality.

We also know that seniors, regardless of their sexual orientation, but in particular LGBT people are discriminated against because of their age, appearance and physical abilities, in society, at work, in families and among their peers.

The law of gender identity now in force in Portugal was a very important step in the recognition of transsexuals and their identities. But much more can be done: firstly, adding the category "gender identity" in all anti-discrimination legal provisions of the Constitution of the Penal Code, through the Labour Code. And the absolute equality of LGBT people still need a lot of work training in key areas such as health, security, fairness or social area. Here too, we affirm the absolute equality of transgender people, transgender and intersex and their ability to decide about their lives and their bodies, and we condemn the attempts to limit their autonomy.

LGBT people have not had adequate responses to their specific with regard to HIV / AIDS and other sexually transmitted infections. We recognize the need and ability of individuals and associations LGBT, from their own experience and knowledge of reality, to help find solutions and ways to have better sex with less risk.

Solidarity - Solidarity for we know that our struggles are not only here, around us, and that the patriarchal society that discriminates against us and attacks throughout the world is. We know that wars, famine, poverty, the danger of environmental catastrophe, gender inequality, xenophobia, racism, discrimination against persons with disabilities are realities of the world we live in and we want to change. We know also that the rights of LGBT people and women are sometimes used as a factor of superiority of one culture upon another, of a supposed war of civilizations that we can only refuse. Human rights are not choose latitudes, governments, cultures or languages. The rights of LGBT people do not exist independently of their right to free expression, quality education, a life in peace.

Liberty, Equality and Solidarity because they are the most basic principles of the human species, where all and we all recognize, and because these are the colors of the rainbow flag that now stand.

Wednesday, June 15, 2011

Carta a Alfred Douglas III


Babbacombe Cliff
[Fevereiro de 1893?]

Meu muito querido Bosie,
Escrevi ao teu criado e não recebi ainda uma resposta sua, o que resulta no mais fastidioso, já que as coisas têm errado as suas cores sem claridade que as ilumine. Estás a estudar? Assim o espero. Procura um bom explicador.
Eu sou bastante infeliz quando não posso escrever - não sei poquê. Tudo está errado. Tens estado a escrever sonetos deliciosos? Nunca recebi o The Spirit Lamp nem jamais um cheque. O meu custo pelo soneto é de 300£. Mas que é que será neste planeta o editor? Deve estar tarifado. Ouvi dizer que está escondido em Salisbury.
Com o maior amor, sempre teu.

Oscar

Sunday, June 05, 2011

Já Fui Pecado


já fui puro e não gostei
gastei o tempo a tentar
aguentar tudo o que diziam
ser-me pecado

já fui de alguém e fugi
que me não quero prender
e viver antes quero
no pecado

já fui buscador de ser
mais limpo que a cal
antes de me questionar
acerca do pecado

já fui mil vidas de santos
e em nenhuma me achei
parecendo ver-me apenas
com pecados

já fui isto e aquilo
muito busquei sem valor
e noutras coisas senti nadar
em pecado

até me questionar deste tempo
de sombras afundado
num oceano de absurdos
que bem vistas as coisas
me não quero santo nem ateu
antes viver do que é meu
e ao ver que do pecado
pouco se tem de consensual
e pelos séculos tanto muda
mais dele não posso crer.

Separado de ti


separado de ti eu me revejo a cair
de um precipício sem gosto
à fuga quando em ti sinto um olhar
tão distante...

separam-me de ti com a tristeza
de todo o gotejar de sal em mim
e mais não sinto senão um rosto
bem distante...

separado de ti por esses conceitos
de bíblias cruzadas por enganos
do que verdadeiramente importa vem
tão distante...

separam-me de ti sem pejo algum
com uma força tão tamanha
nessa cruzada a teu beijo ser
bem distante...


separado, a cair, a gotejar
tão distante estou de ti
que será uma aventura
ter teu beijo só para viver
tudo aquilo
que a distância não cura...

Wednesday, June 01, 2011

Quadro com um anjo


A tua pele não mais se ressente das mágoas que te causei. Se antes gostava de te ter comigo, a verdade é que desde que desceste e te tornaste um conquistado, não vejo outra utilidade para o teu corpo. Antes tinhas penas nas asas. Antes tinhas as tuas mãos tatuadas com os teus nomes sagrados nas letras que apenas os imortais podem ler. Antes tinhas o rosto angelical, impossível de causar qualquer ferida. Antes eras um imortal e agora um completo mortal todo invadido de carnalidade.
Divindade no teu corpo se desvaneceu. Tudo o que havia em ti de divino descende para a pior parte de um humano com o registo de um nascimento doloroso. e como todo o nascimento tem o seu choro, assim também os teus olhos - as únicas partes divinas em ti - começaram a chorar o meu abandono. Sei não me perceberes. Para ti o amor que tinha para contigo deveria durar eternamente. Para mim o amor dura o tempo necessário a fazer de alguém a minha presa capturada. Agora eu leio em ti todas as mágoas que ninguém consegue ler nos textos mais proibidos e sagrados. Leio todos os sinais do teu corpo criados por essa tua queda do mais alto dos céus onde habitavas. As letras são-me incógnitas mas vejo que nelas existia a luz que entretanto foste perdendo nesta noite escura.
As engrenagens do relógio troam o passar do tempo. Não vejo mais a hora de me abandonar deste local onde me encontro. A hora eterna de me ver deitado sobre a cama de um outro anjo ou de conviver com um perverso demónio. As vinte e duas letras que tinhas dispostas nas tuas costas vão desaparecendo ante a minha vista. A primeira queria dizer coroa. A que resta antes de ela mesma desaparecer se traduz por mundo. A tua vinda foi do mais alto coroado para o mais baixo e vil mundo. E qual o objectivo?
Por que te sacrificaste?
Foi por mim? Ou foi por ti? Por nós?
Não há em nós futuro que valha a pena escrever num Evangelho. Nem mesmo a tua vera queda ao mundo mais tentador da tua divindade. Nem mesmo eu te vou restar.