Wednesday, January 31, 2007

Fantasmas de uma cidade 12-Set-2006

As pálpebras abrem-se para recortar a visão do que vejo.
Pessoas, coisas, carros, cidades...
Miro fixamente o que de mim consegue ver
Perdendo um instante nos fantasmas
Prestígio da nossa existência corpórea.

Rio-me da estúpida sintaxe com que Platão me atinge
Interrogo-me quem tem razão.
Sentamo-nos.
Duas cadeiras prestam-se aos nossos serviços -
Espero que fale.
Nada do que ele me diz me interessa e amaldiço-o a ele e à sua caverna.
Observo-o porque os meus ouvidos se fecharam
Retendo apenas na memória a campainha do elevador
Observo a sua boca mexer-se;
Reparo que tem três dentes cariados.
Súbita e inesperadamente levo com um banho de vinho do Porto sob a minha camisa branca
O empregado envergonhadíssimo pede mil desculpas
Irrítadíssimo - ou dando ares disso - desnudo o meu tronco
Peço que ma mandem lavar
- Apesar de tudo isto Platão não parou nem um momento o seu discurso.
Sobra-me estômago para mudar de mesa;
O fantasma roga-me uma praga que acrescento no meu livro negro.
Tomo uma aspirina para me manter a depressão viva.
- Um café por favor.
Agora terei de esperar pelo menos uma hora pela minha camisa
Pobre dela, pensar que me custara os olhos da cara
Vou aos toiletes e lavo a cara
Os meus olhos não conseguem manter-se abertos e ainda preciso de mais 45 minutos
Banho o meu pescoço com uma onda de água fria
Olho as minhas pálpebras, notando o negro das olheiras
- Oh tempo de ir!
Pelos poros da minha pele inrompe tinta negra.
Com as mãos tento remover essa espécie de melaço;
Quanto mais removo, mais a tinta se compõe em desenhos negros
Deixo-me revestir de tatuagens enquanto a cafeína toma efeito
As minhas unhas projectam-se além da realidade
E o meu espírito projecta-se num outro eu
Ele veste uma camisa branca engomada
Os seus olhos estão estagnados de ódio e vingança - atira-me para um cubículo da retrete
Abre o fecho das calças e mija para o chão
Eu agonizo.
Ergue-se com a altivez de um Luís XIV
Eu amargo a um canto como um mutilado Quasímodo
Um ódio, uma raivade não conseguir sair do wc,
Conseguir atirar uma mesa para o chão, mas ele pode.

Devoro o remorço da raiva de não ser ele
E, no entanto sou eu e ele ao mesmo tempo
Ele já não está aqui
E eu sinto que fiquei doido de vez
Peço um copo de vermute
O meu corpo acumula o suor na epiderme
E os meus pêlos aconchegam-se de frio
Sonho tomar um forte ácido para derreter a minha digestão
Que remoi em azia as minhas entranhas
Reparo que Platão está ao lado de uma rapariga
Nada lhe diz
Quem lhe fala é Napoleão
Como um anjo da guarda, acompanha-a o sábio Platão.
Esqueço que o mundo me detesta e peço mais vermute
Vomito tudo o que tenho cá dentro e chamo por Galileu.
Peço-lhe que vá para a N.A.S.A. e me contrua um foguetão
Diz-me não saber o que é
Berro por Elizabeth.
A rainha frígida como sempre, aparece e nada diz
Senta-se ao meu lado e jogamos uma bisca.
Farto-me destas coisas e chamo por Pitágoras.
Ele aparece com a minha camisa branca.
- Finalmente vestido!
Saio do café.

A intelectualidade do escombro de certas cidades revolve-me os olhos
Já de si tão enevoados.

Wednesday, January 10, 2007

O louco

Vivo num mundo cruel sem que a ele me consiga adaptar completamente. Sou um estranho que habita neste mundo esperando que as pessoas me consigam olhar e consigam ver. Sempre o mesmo; parece que tenhgo sobre mim uma máscara que impede todos de me verem, de me escutarem, de me compreenderem.

Nesta imagem que faço de mim espanto-me. Olho para mim como um príncepe olha para o espelho ansiando o dia em que será feito rei. Vislumbro um espelho de enganos dessa terra que prometo e garanto a mim mesmo que existe; sei lá se existe... nem mesmo às vezes me conheço o suficiente para saber se é verdadeira se mentira esta energia que sinto eclodir dentro de mim.

Por vezes sinto nas minhas mãos toda a materialização da ira que tenho acumulado neste mundo sem que dela me consiga libertar, sem que dela abra mão para esse mundo que não conheço nem sei se existe.
Todos os dias brinco com as minhas mãos colocando nelas um poder imaginado capaz de mover paredes, de erguer bolas de forgo e de concentrar toda a energia que flui na alma desse alguém.

Sou um auto-engano, um reflexo irreal de mim mesmo que não consegue vislubrar a distinção entre o real e o imaginário. o poder de uma borboleta que segue sem rumo no mais ofuscante dos meios.

Ele tem garras que me arranham por dentro e me prendem a um estado de ilusão que por vezes rui como um baralho de cartas; por vezes surge como uma súbita onda que me cerca para encontrar em mim alguma coisa de bom no que me rodeia. Eu sou essa eterna criança que teima em crescer; que vê o mundo e espera mais dele do que o mundo lhe pode dar; que anseia por castelos feitos de papel e de nuvens... Que encontra nos seus inimigos seres que consegue derrotar pelo poder da sua vontade, que lhes consegue rotular com uma praga de mau destino, de infelicidades...

Eu sou um monstro encarcerado nessas grades que construo com alegria e boa disposição; eu sou essa besta medonha feita carniceira que anseia sugar de todo o mundo todo o tutano da sua beleza para o concentrar em si mesmo. Sim, sou essas garras, essas lágrimas, esses arranhoes que me destroem...
Eu sou essa pilha de energias que não consegue mais conter mas que vai inchando até à sua destruição total e de todos os que a rodeiam. Não sou feliz sozinho; não consigo ser feliz... Até para morrer tenho de me autodestruir levando comigo almas para serem vítimas dos demónios que me deveriam açoitar...

Não sei...
Parece que no fim de tudo não sou nem esse lado bom nem esse lado mau...
Sou uma ilusão de algo grande...
Sou mais um... apenas isso...
Consolo.